sexta-feira, 15 de dezembro de 2006

Encontrando Varginha

Aos poucos vou escrevendo dos grandes momentos do candomblé na minha vida.
Queria criar um pouco de mistério até chegar no meu encontro com o Babalorixá José Carlos de Ibualamo, más aqui vai:
Começou quando li uma matéria dele no jornal que ele fazia na época (Nossa Voz). Confesso que o que chamou minha atenção foi a fato de que a roça estava localizada em Santo Amaro (finalmente um candomblé civilizado, num lugar central)
Quando liguei e falei com ele foi me passado que tinha que pegar a av. Antonio Villela (Parelheiros) até Varginha. Estranhei, já que achei que era em Santo Amaro. Quando falei que era mais longe que imaginava Zé Carlos protestou: "É pertinho, é rápido." Ainda não sabia mas existem 'formulas' para calcular este tipo de coisa. Por exemplo, 'pertinho' significa que se vc estiver dentro de um carro botando a conversa em dia com o Babalorixá Zé Carlos, a distancia passa rapidinho. 30 km parecem 3 km. Vc nem percebe. Mas se vc estiver sozinho no carro, indo para o Ile Varginha pela primeira vez sem a companhia do Zé Carlos, é longe pra caramba. Até hoje todo mundo reclama da distancia da casa. Todo mundo fala a mesma coisa, "Nossa adorei o Zé Carlos, mas, nossa! Que longe, né?"
É longe pra burro, e pra quem dirige Gol 1000, mais ainda. Esta coisa de pai-de-santo medir distancia não da. Babalorixá, pai-de-santo, zelador, etc... estas pessoas deviam ser proibidas de falar em termos de distancia, e de tempo também: Tipo, se vc estiver esperando para ser atendido por um pai-de-santo e alguem sai e diz que ele vai te atender em 5 minutos bota uma hora e meia nisso, e olha lá. Eu mesmo já tenho uma fórmula. Tempo de axé é equivalente a tempo normal + 1h30. Candomblé vai começar as 8. Chegue lá 9 e meia que o pessoal já esta pensando em se vestir para começar.
(Tempo e distancia, combinados, são uma dupla explosiva, especialmente na Bahia. Certa vez liguei para falar com Pai Ari, do Pilão de Prata, descendente da família Bangboxe, e ele não so garantiu que a casa dele era perto de onde eu estava, quanto me garantiu que estava aberto à possibilidade de me deixar fotografar a casa. Eu cheguei lá depois de não sei quantos ónibus errados, subi a longa ladeira até a casa dele, completamente ensopado (era Janeiro) e fui, eventualmente, depois de um bom tempo, muito bem recepcionado. Me mostrou o quarto de Oxalá, atrás do barracão, que fez por confiar em mim, e por ser uma pessoa aberta. Claramente é uma pessoa muito capaz e intelligente. Jamais vou esquecer o quarto - com pé direito lá nas alturas.
Até ai tudo bem. Infelizmente, ele me informou que não podia tirar fotos aquele dia. Perguntei por que? (uma vez só: geralmente este tipo de pergunta se faz uma vez só) Recebi aquele olhar do tipo: não vou te responder.
Lembrei da visita que o Pierre Verger fez para Londres, onde ele disse que ele nunca abria a boca no candomblé, simplesmente esperava as pessoas contarem as coisas para ele. Jamais teria o Pierre questionado uma decisão daquelas que o Pai Ari tinha me passado. Que cagada minha. Mas eu sou meio assim. Expliquei que não viajava com dinheiro público, de pesquisa de uma CNPq da vida, não tinha o luxo de poder voltar e tal. Pai Ari não estava nem ai: não é que o povo-de-santo sacrifica tudo, tempo, dinheiro para visitar um irmão de santo - paulistas nem piscam quando chega a hora de ir visitar o Tio Linô lá no Rio, ou o Baiano lá no parque fluminense. Então o que adianta o gringinho travestido de fotografo querer reclamar de seus sacrifícios.
"Vc pode voltar amanha e tirar três fotos."
E foi isso: tempo e distancia. Tive que voltar o dia seguinte, esperar tudo de novo e não é que foram 3 fotos mesmo, nem uma a mais. Uma do barracão, uma do museu, e outra da entrada.)
Voltando ao Axé Varginha: peguei a rua que vai até Varginha e me perdi totalmente. Não carrego celular (até hoje) e a coisa foi piorando até virar aquele pesadelo total. Num momento estava tão confuso com tudo que cortei um cara que não aguentou mais, saiu do carro, sacou um revolver e apontou na minha direção. Eu estava tão atrapalhado que estava, naquele instante, dando ré. Uma ré muito bem dada por sinal por que logo sai da vista dele, e ele da minha. Depois de duas horas dessa brincadeira cheguei na casa da Egbomi Elsa, pensando que tinha chegado, e alguém indicou o caminho até o Axé Varginha.
Entrei lá e o cachorrinho do Zé Carlos, um cocker spaniel meio bege, anunciou minha chegada. Não lembro bem mas acho que o Zé Carlos estava usando um chapéu meio cowboy, meio fora-da-lei, e mexendo inocentemente um ebó com o dedo.
Z-C:"Oi. Que rápido."
ROD: "Bem......deixa para lá."
(to be continued...............)

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